Entrevista: Celso Possas fala sobre o mercado literário


O criador da Feira Literária de Niterói é o entrevistado da semana

Desde 2020, com os confinamentos devidos à pandemia, os livros se tornaram aliados indispensáveis para quem foge do tédio e da monotonia. Em meio ao noticiário sobre conflitos, crises econômicas e sanitárias, os niteroienses encontram na leitura os melhores conteúdos e o alívio necessário para seguir adiante. Em se tratando de um município que se destaca em diferentes áreas da cultura, é importante saber como está o mercado editorial e os negócios na área de livros.

Para entender melhor o que está acontecendo conversamos com o editor Celso Possas. Deixando para trás sua promissora carreira na área executiva de grandes empresas, Celso criou a Editora Itapuca, com a intenção inicial de produzir cinco livros, de três autores. Como empreendedor e criador da Feira Literária de Niterói ( Flinit), ele acredita e exalta Niterói, homenageada de diversas maneiras, a começar pelo nome da editora. Além de publicar essencialmente escritores niteroienses, cujas obras em sua maioria tem Niterói como cenário.

Diário de Niterói: Por que temos tão poucas livrarias no Brasil? 

Celso Possas: Quando alguém me pergunta sobre o número de livrarias no Brasil, eu lembro daquela lenda que muita gente repete, de que a cidade de Buenos Aires tem mais livrarias do que o Brasil, o que não é verdade. Mas isso não muda o fato de que o país tem poucas livrarias e poucas bibliotecas também. E o que é pior, o Brasil por volta de 2010, 2012, chegou a ter 3.500 lojas e antes da pandemia, esse número tinha caído quase pela metade, em torno de 1.800 livrarias.

Eu tenho dúvida, quando acabar a pandemia, se serão 1.000 livrarias no Brasil. Nós temos 5. 570 municípios e pode ser que a gente chegue ao final do ano com menos de 1.000 lojas no país. Um dos sonhos que eu tenho era ter uma livraria.

Quando eu larguei tudo para ser escritor e editor em 2016, eu fui estudar também uma pequeno empreendimento e por mais que colocasse criatividade em eventos, palestras e lançamentos, a conta não fecha, mesmo com o aluguel mais barato em Niterói, em uma livraria de bairro.

Meu sonho é uma livraria pequena de bairro, café, chocolate e muita conversa, muita gente que goste de livro frequentando. Infelizmente, a conta não fecha. O Brasil poderia ter um projeto oficial de proteção e incremento às livrarias.

Diário de Niterói: Por que o brasileiro lê tão pouco?

Celso Possas: Eu acho que a leitura, principalmente hoje em dia, sofre uma concorrência muito grande. O adolescente, às vezes, gosta de ler mas tem o videogame, tem a Netflix, tem a televisão, tem o futebol, Tv a cabo com muitos canais e muita oferta de entretenimento.

O poder aquisitivo também atrapalha. Eu sempre digo, coloque um livro barato na frente do leitor, no gênero que lhe interesse, ele vai comprar, ele vai ler. A gente vê isso nas feiras literárias. As pessoas entram para comprar um, dois livros, saem com sete, oito livros. Se o livro estiver com bom desconto, ainda mais com o autor presente, autografando, o pessoal gosta.

Eu acho que isso é um contexto e eu sempre digo aos mais jovens, joguem videogame, vejam futebol, mas leiam um pouco, duas ou três horas por semana porque faz bem e é um prazer. Não abram mão de um prazer como é a música, a TV a cabo, como é um filme, como é um jogo. Eu acho que é competição e poder aquisitivo, estes são os dois problemas que deveriam ser combatidos para o aumento da leitura.

Diário de Niterói: O que pode ser feito para ampliar o número de livrarias no município?

Celso Possas: Niterói têm papelarias e até tabacarias, bancas que vendem livros, mas algumas livrarias foram fechadas em Niterói. As principais são a Blooks, a Travessa e a Schofer Books em Icaraí, ViverLendo em Itaipu e dois ou três sebos no Centro. Niterói não foge à regra, embora muitas cidades não tenham sequer uma livraria.

No passado tivemos grandes livrarias como a Passárgada, Portinari. No momento, com vinda da Travessa, temos uma boa oferta. Quem quer uma livraria vai encontrar boas opções em Niterói. Quanto a incentivos que podem ser adotados, existe uma medida que é a Lei do Preço Fixo. A França, acho que a Alemanha e Itália já adotaram.

Basicamente, é proibir qualquer entidade de vender um livro abaixo do preço de capa, de noventa por cento do preço de capa por um ano. Isso freou a queda de livrarias na própria Europa que chegou a perder quase um terço de lojas do setor com a chegada da Amazon.

Os Estados Unidos perderam vinte e cinco por cento das livrarias e quase quebrou a Barnes & Noble. A Lei do Preço Fixo está em discussão no Congresso e por algum motivo parou. Mas deve ser aprovada porque todos os atores da cadeia produtiva do livro são a favor.

Diário de Niterói: Qual a situação do mercado editorial após 1 ano de pandemia?

Celso Possas: A pandemia tem mudado tudo, nada está igual ao que era. A situação das livrarias se agravou, porque são menos lojas, algumas fechadas por muito tempo, pelas medidas de isolamento, significando menos oportunidades para editoras pequenas e médias.

Para as editoras grandes é um ano muito ruim de venda física, para as pequenas e médias, mais ainda. Porque estas editoras sempre se caracterizaram por menos venda em livrarias e mais venda em eventos presenciais, basicamente feiras literárias, lançamentos e concursos. Este tipo de evento, obviamente, está completamente parado. Não há feira literária, nem grande, nem pequena, nem média, nem ao ar livre. Então é um ano muito difícil para a venda em papel.

Por outro lado, como em todos os produtos, as vendas online cresceram vertiginosamente e nos casos dos livros, a venda de E-Books está batendo recorde, mês após mês, neste caso beneficiando è editoras pequenas, médias ou grandes e autores mais ou menos consagrados. Eu torço para que quando acabar a pandemia, o mercado volte ao que era antes e o mercado digital com e-books e livros de papel, se mantenha. Seria um mundo um pouco melhor no fim da pandemia.

Diário de Niterói: A Feira Literária de Niterói em todas as edições, contou com grande presença do público. Como surgiu a ideia da Flinit?

Celso Possas: A ideia da Flinit surgiu de uma conversa com minha filha Juliana. Nós estávamos conversando sobre as feiras que a gente vinha participando em Resende, em Poços de Caldas e no Rio. Nós estávamos inconformados em não haver um evento frequente em Niterói daquele que você sabe que tem todo ano. Juliana, então disse: “vamos criar um, nem que comece como um encontro de autores.

Demos sorte, de contar com o convite do Praia Clube com uma estrutura espetacular que cabe uma feira literária inteira lá. Daí surgiu a Flinit, de uma forma muito aguerrida, no primeiro ano, fomos atrás de autores, patrocinadores, muito trabalho, muita conversa, foi um sucesso.

Isso foi em 2018, em 2019 veio a segunda edição que foi maior, foi sensacional. Na primeira, a gente teve oito ou nove ônibus de colégios, na segunda, a gente teve oitenta. Foi muito bacana, com todo mundo falando que a Flinit veio para ficar e se tornou um lema, a Flinit veio para ficar.

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