Iniciativa da UFF inova o acompanhamento de hipertensos resistentes com o uso da telessaúde – Diário de Niterói
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Iniciativa da UFF inova o acompanhamento de hipertensos resistentes com o uso da telessaúde


Segundo o Relatório da Organização Mundial de Saúde 2023, cerca de um terço da população adulta mundial convive com a hipertensão arterial, uma condição crônica e silenciosa que pode causar sérias complicações cardiovasculares, renais e neurológicas. No Brasil, mais de 50 milhões de pessoas com idade acima de 30 anos convivem com a pressão alta. Estima-se que 388 brasileiros morram por dia devido a hipertensão arterial e o Ministério da Saúde, com o objetivo de conscientizar a população brasileira sobre a importância do diagnóstico preventivo e tratamento adequado, implementou a data de 26 de abril como o Dia Nacional de Prevenção e Combate à Hipertensão Arterial. 

Entre os hipertensos, há um grupo específico que exige atenção ainda mais próxima, os quais são classificados como hipertensos resistentes, cuja pressão arterial segue elevada mesmo com o uso combinado de três ou mais medicamentos anti-hipertensivos. Para atender esse público, o Programa de Telessaúde a Hipertensos Resistentes desenvolvido no âmbito do Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP) da Universidade Federal Fluminense (UFF) vem redesenhando o cuidado oferecido. Criado durante a pandemia, o modelo alia teleatendimento, telemonitoramento, teleducação e teleconsulta, bem como no uso de escalas clínicas e ações de educação em saúde, com foco nos hipertensos já vinculados ao ambulatório de hipertensão do HUAP. 

O programa integra o Núcleo de Telessaúde do HUAP, como uma experiência exitosa reconhecida pela Gerência de Ensino e Pesquisa (GEP) e pela Agência de Inovação UFF (AGIR), e está sob coordenação da Professora Doutora Dayse Mary da Silva Correia do Departamento de Fundamentos de Enfermagem e Administração (MFE) da Escola de Enfermagem Aurora Afonso Costa (EEAAC), e do Professor Doutor Ronaldo Altenburg Gismondi do Departamento de Clínica Médica (MMC), da Faculdade de Medicina.

Tecnologia no atendimento humanizado à hipertensos resistentes

Segundo a professora, junto dos estudantes de graduação e pós-graduação em Enfermagem, somente no período pandêmico e pós-pandêmico, entre abril de 2020 e junho de 2021, foram realizadas 1.490 chamadas no telemonitoramento. Os atendimentos contam com uso de computadores do hospital e celulares cadastrados ao canal oficial de um WhatsApp. Os registros são feitos em prontuário próprio e acompanhados com o consentimento formal dos participantes. E acrescenta que “muitas vezes o que falta não é uma grande tecnologia, e sim reforço do vínculo, do apoio profissional e da escuta ativa”. 

Correia destaca que, além de conversar com o paciente, tanto na consulta de enfermagem presencial quanto na teleconsulta de enfermagem, investiga outras dimensões biológicas que nem sempre aparecem no exame físico. Visto que, “muitos pacientes entendem que a pressão só “sobe” quando estão nervosos, ou que é “algo isolado do resto do corpo”. No entanto, a hipertensão traz outros sintomas, pois afeta o rim, o coração, o humor, a disposição, há muitos relatos de dor, tristeza, insônia, os quais afetam e impactam na adesão do tratamento, no controle da pressão e na qualidade de vida. Lembrando que o hipertenso resistente necessita diariamente de três ou mais de medicamentos somente para controle da sua pressão arterial. Precisamos cuidar da pessoa, não só da doença”. 

Nesse contexto, esse acolhimento humanizado e ampliado é uma das marcas do modelo de cuidado proposto, e reforça o papel importante de ações terapêuticas da enfermagem na atenção à saúde. Escalas validadas são aplicadas para avaliar aspectos como adesão ao tratamento, autopercepção de saúde, presença de dor crônica, humor, qualidade do sono e riscos associados à hipertensão.

Segundo a coordenadora do programa, “a experiência inicial somente da ação de telemonitoramento como uma estratégia inovadora durante a pandemia da Covid-19, junto aos hipertensos resistentes proporcionou melhoria da qualidade de vida, como dito por eles, tornando-se fundamental para dar apoio, acolhimento, informação e segurança no autocuidado e na adesão a terapia medicamentosa”. Ela ressalta também que “a escuta ativa em todas as atividades traz apoio emocional, auxiliando em situações tão essenciais como o controle da ansiedade, nervosismo, angústia e o sentimento de solidão”.

A docente conta que o uso de escalas clínicas também permite acompanhar a evolução dos sintomas e sugerir encaminhamentos para o médico ou para outros serviços de especialidades, quando necessário. 

Trajetória do Programa

A história do Programa de Telessaúde a Hipertensos Resistentes do HUAP começa em julho de 2017, com ações de extensão voltadas ao acompanhamento dos pacientes do ambulatório de hipertensão arterial resistente do Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP), por meio da monitorização telefônica realizada a cada três meses.

Com a chegada da pandemia de Covid-19, em abril de 2020, o modelo de acompanhamento precisou se adaptar rapidamente. Foi então estabelecido o telemonitoramento mensal, que posteriormente resultou, ainda em 2020, na criação do Programa de Telemonitoramento de Hipertensos Resistentes no contexto da Covid-19, de contato semanal. Esse novo formato incluiu ações como telemonitoramento, teleatendimento, tele orientação e teleconsulta médica.

“Durante o período de isolamento, foi feito um planejamento com docentes, estudantes e membros do grupo de pesquisa sobre hipertensão acerca do formato do contato telefônico, inclusive com roteiro e planilhas de registro para cada paciente contactado e sob acompanhamento. Foi essencial!! Pois, estávamos todos sob isolamento ou distanciamento social, e eles não poderiam vir ao ambulatório, mas queriam conversar, precisavam tirar dúvidas, falar da pressão. Ou seja, tal ação que surgiu como um cuidado institucional estendido para o vínculo com o paciente, resultou em algo muito maior”, relata a professora Dayse Mary Correia, coordenadora da iniciativa.

Desde então, o que era uma medida transitória tornou-se uma ferramenta potente de cuidado contínuo, mesmo à distância. A equipe utiliza um canal oficial de WhatsApp, de onde se enviam orientações, vídeos informativos, marcação de teleconsulta e ainda acompanha os pacientes, por meio de mensagens, em períodos intermediários entre as consultas médicas presenciais — muitas vezes espaçadas por meses, mediante ao controle da pressão.

Educação em saúde: informação como ferramenta de autocuidado

O reconhecimento do programa como uma tecnologia social, em 2022, pela AGIR/UFF, consolidou a relevância do projeto no cenário acadêmico e assistencial. Além das teleconsultas, o projeto aposta na teleducação como eixo estratégico. Um dos produtos mais interessantes é a série de vídeos e do podcast, desenvolvidos por estudantes da graduação e pós-graduação sob supervisão docente, voltados aos hipertensos. 

Por exemplo, quanto ao podcast, “eles ouviram e logo se identificaram. Alguns mandaram mensagem perguntando: ‘Doutora, eu estou fazendo tudo errado, não é?’. Outros enviaram emoji rindo, outros agradecendo. Isso é educação em saúde: chegar no outro com linguagem acessível, criando vínculo e reflexão”, comenta a docente.

Os áudios simulam uma conversa leve e direta com o paciente, com orientações sobre mitos e verdades da hipertensão, uso correto da medicação, importância da atividade física, o risco do desenvolvimento da doença renal, entre outros temas. O conteúdo é enviado diretamente por WhatsApp, e os vídeos vêm sendo bem recebidos pelos hipertensos. O uso de diferentes estratégias interativas tem sido fundamental para despertar interesse, promover melhoria na adesão ao tratamento e ampliar a autonomia do paciente no cuidado com sua saúde.

Além disso, em 2024, foi publicado um e-book informativo gratuito para os hipertensos e sociedade sobre aspectos abrangentes da hipertensão arterial, tendo apoio editorial da coordenação do Programa Acadêmico em Ciências do Cuidado em Saúde (PACCS), o qual teve a construção colaborativa de docentes, profissionais de saúde, estudantes de graduação e pós-graduação.

Hipertensão Arterial: uma questão de saúde pública

No momento, a meta do programa é consolidar o espaço da teleconsulta de enfermagem ao hipertenso resistente, com início em maio de 2024, no sistema do prontuário eletrônico hospitalar do HUAP, garantindo o reconhecimento formal da atuação no acompanhamento remoto, como já é reconhecida tal ação quanto o acompanhamento presencial na consulta de enfermagem no ambulatório. “Estamos em diálogo permanente com a Doutora Verônica Alcoforado de Miranda e Doutora Michele Nascimento, na Superintendência do HUAP, visando um cuidado inovador dentro da recomendação do SUS”, explica a professora.

Ela reforça que a telessaúde não substitui o cuidado presencial, mas amplia e fortalece o acesso, especialmente para pessoas que enfrentam barreiras econômicas, geográficas ou físicas. “O cuidado à distância, quando bem feito, é próximo. A tecnologia permite que estejamos lá, mesmo sem estarmos fisicamente presentes, e o paciente sente e diz isso”, acrescenta a docente.

O projeto é um exemplo concreto de como a universidade pública pode contribuir com soluções inovadoras e acessíveis para desafios persistentes da saúde pública. Em um cenário de aumento das doenças crônicas, como a hipertensão arterial,  envelhecimento populacional e sobrecarga dos serviços de saúde, ações de telessaúde têm elevado potencial de contribuição no efetivo acompanhamento, intervenções terapêuticas não farmacológicas e  promoção de saúde. “É fundamental que haja esforço institucional e profissional, sobretudo para o desenvolvimento da autogestão da doença crônica e autocuidado”, conclui.

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Dayse Mary da Silva Correia é Doutora em Ciências Cardiovasculares pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense, com período sanduíche na York University, Canadá.

 

Por Fernanda Nunes
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